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7 de julho de 2011

O Nevoeiro (2007)

Um filme de Frank Darabont com Thomas Jane, Marcia Gay Harden e Laurie Holden.

O homem gosta de viver uma vida falsa. Tão falsa que raramente ele vive, ele apenas finge. Nietzsche chamaria um homem que realmente vive de super-homem. O resto é tão afundado na própria mentira que não consegue mais distinguir a vida da influência externa. E é exatamente nesse ponto, na falta de uma influência externa, na falta do que fingir, que o homem realmente revela sua essência: somos todos animais, até irracionais, buscando por sobrevivência. Foi o que Buñuel fez em seu filme O Anjo Exterminador; foi o que Saramago fez e foi adaptado aos cinemas por Fernando Meirelles em Ensaio Sobre a Cegueira; e é o que Stephen King fez nesse seu conto de terror, muito bem adaptado por Frank Darabont. Mas o terror do filme não fica por conta do desconhecido ou de monstros. Apenas da humanidade.
Numa noite, na cidade do Maine, ocorre uma forte tempestade que derruba árvores e destrói casas. No dia seguinte David Drayton (Thomas Jane), um artista local; seu filho Billy (Nathan Gamble); e seu vizinho Brent Norton (Andre Braugher) vão até o mercado para conseguirem suprimentos caso a tempestade volte. Porém, no mercado as as coisas começam a desandar: a névoa que surgiu após a tempestade tomou conta da cidade e, aparentemente, há algo estranho e mortal dentro dela. Mas, à medida que o tempo passa, o perigo passa a existir tanto fora quanto dentro do mercado.
A convivência com o desconhecido, com as mesmas situações, as mesmas circunstâncias, sem nenhuma previsão de mudança, tudo isso é bastante para enlouquecer alguém. É o bastante para o homem mostrar sua verdadeira essência, sua verdadeira face. O ser-humano é um animal racional até se deparar com o irracional. Então ele perde toda a sua distinção entre um animal. Há de se perder a cabeça e enlouquecer, há quem não aguente e tente se suicidar e há todos aqueles pecadores, que após uma vida inteira de infâmias e maldades, decidem se redimir de última hora. Afinal, para que garantir o plano terrestre se ele já está perdido? E é nesse ponto que O Nevoeiro entra e esse se torna um lugar-comum. Enquanto a religião está em primeiro plano, o estranho nevoeiro se torna apenas um problema qualquer. Enfrentar pessoas alienadas é a verdadeira dificuldade. O extremismo religioso é o verdadeiro monstro do nevoeiro, a verdadeira face de todas as almas perdidas. Quando você se encontra num estado de desespero, você agarra qualquer coisa que possa te tirar daí, nem que isso envolva o mal alheio. Qual é essa crença num plano superior de bondade, mas na fé de um Deus que castiga e pune?
Quando pessoas de diferentes opiniões ficam no mesmo ambiente por dias, é possível uma paz? A própria política mundial prova que não. Ateus se dividem, infiéis somem e apenas os verdadeiros crentes sobrevivem. Qualquer coisa é possível para acabar com a falta de fé e alimentar as esperanças no Deus punidor do judaísmo. A bíblia, sendo seguida ao pé da letra, dizima uma sociedade mais do que um nevoeiro propriamente. A fé cega é a resposta mais fácil para se resolver problemas além do que a própria ciência pode explicar - e esse é um dos poucos erros do filme. Numa sociedade como a de hoje, onde todos exigem uma explicação para o que acontece, os melhores filmes do gênero terror só conseguem tal façanha se deixam a ambiguidade do que realmente ocorre no ar. Não se pode dizer ou comprovar por meio de outras realidades se criaturas mutantes ou demônios realmente existem, é bem mais fácil colocá-los ao público, que irá se assustar devido ao tamanho de sua crença pessoal. Por algum motivo, essa realidade sobrenatural funciona bem melhor nos livros de Stephen King do que nas diversas adaptações de suas obras.
Sobreviver dentro é difícil, sobreviver fora é impossível. Por mais que O Nevoeiro consiga fornecer explicações falhas para os céticos de plantão com desculpas em experimentos militares, o visual do filme é ótimo. Os efeitos visuais não falham na criação de aberrações que se assemelham a animais, isso sem revelar muito do que se esconde por detrás do nevoeiro. A névoa esconde tudo e está ali, aterrorizante, em cada cena. A atuação da obra fica na mão de Thomas Jane, que consegue criar uma imagem agradável no longa-metragem, mas nada que deixe o longa mais convincente. Sua dolorosa interpretação beira muito mais um drama do que um terror, propriamente dito. Mas as partes onde ele se depara com o significado de uma relação familiar, elas são valorosas. Andre Braugher consegue ser melhor. Em poucas falas, ele atinge o lado da racionalidade e já mostra para o que veio, com um diálogo fácil. A atuação feminina se sobressai. Laurie Holden, que interpreta Amanda, está boa. É uma pena não vê-la tanto no longa. A verdadeira antagonista - não, não o nevoeiro - é Marcia Gay Holden, e de longe a melhor atuação do filme. Ela, que interpreta a extremamente religiosa senhora Carmody, é carismática o bastante para convencer o espectador a se ajoelhar e rezar na sessão, além de sempre manter seu olhar fixo, gerando uma imagem de lunatismo e medo.
Após aproximadamente duas horas, O Nevoeiro mostra para que veio. Não apenas para assustar em certas cenas ou então para passar uma mensagem no fim. Para mostrar o quão tênue é a linha da sociedade, do comportamento social, e o quanto tudo isso é mutável pelo medo do desconhecido. Não se pode dizer o que ocorre na mente de uma pessoa insana depois de tantos traumas. E não se pode dizer o quão depressivo é ver a sanidade chegar numa mente traumatizada. Afinal, depois que o nevoeiro cega e tira o que resta de humano, a visão volta. Mas só se vê fumaça.
NOTA: 8

7 comentários:

Augusto disse...

mt bom esse filme e é um classico de suspense desde ja..acho que merecia indicação e premio neah? o suspense e elenco estao otimos mesmo viu.

vc nao ouve mesmo nenhuma dica e eh uma pena isso...continua escrevendo seus textos enormes com detalhes do filme e naum sao objetivos...poxa...mude isso. abraço e reflita.

Adecio Moreira Jr. disse...

Pra mim, um texto que já começa citando Nietzsche e sua concepção "super homem" não poderia deixar de ser lido, mesmo se tratando de um filme do qual ainda não vi e, sinceramente, nem tenho curiosidade em ver (ainda que tenha boa nota contigo).

Alan Raspante disse...

Estou com esse filme em casa pra assistir já tem um bom tempo, mas sempre acabo adiando... Tá na hora ver! hehehe

Anônimo disse...

Hi Do not quite understand what is at stake.

renatocinema disse...

Fui assistir sem esperar nada, não conhecia o filme nem tinha ouvido falar nada sobre ele. Gostei.

O final é o meu estilo. kkk

Sobre Tarantino.....como assim não viu Cães de Aluguel? Assista hoje. Amigo é um filme obrigatório.

Jackie Brown você coloca na lista.

Abraços

Kamila disse...

Eu me lembro, até hoje, da sensação que tive ao assistir a este filme pela primeira vez. Não sou a maior fã de filmes de suspense/terror, mas esse filme aí me deixou agoniada. Fiquei pensando no personagem principal por dias...

Andinhu S. de Souza disse...

Acho um filmaço. Tenso, e nada previsível.