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1 de julho de 2011

Corações Perdidos (2011)

Um filme de Jake Scott com James Gandolfini, Melissa Leo e Kristen Stewart.

Não existe uma maneira fácil de se lidar com a perda, ainda mais quando a perda é muito substancial. Há perdas que somem com o passar do tempo, há perdas que retiram um pedaço da alma. E quando a perda é grande o bastante para controlar a rotina, o que fazer? Deixar esquecer ou se agarrar ao que perdeu, buscando cada vez mais lembranças por momentos juntos? Não se pode seguir uma vida sendo controlado pela perda, ou então se perde uma vida. Corações Perdidos é um filme unicamente sobre a perda, que trabalha em dois conceitos distintos, mas interligados entre si.
Doug Riley (James Gandolfini) e Lois Riley (Melissa Leo) são um casal triste. Após casados há 30 anos, eles perdem a filha adolescente. Ambos abalados, o luto deles perdura por anos. A memória da filha para de deixá-los viver como um casal e os faz mortos. Até que Doug vai a Nova Orleans para tratar de negócios de trabalho. Lá, ele conhece a prostituta Mallory (Kristen Stewart), uma adolescente de 16 anos que acaba fazendo o que os 8 anos de perda não fizeram aos Rileys. A partir desse ponto, o filme vira um conto realista sobre a superação e sobre pontos de apoio para a perda.
Doug e Lois estão perdidos na vida. Lois está parada em sua casa, perdendo graças a sua perda. A convivência com a sociedade foi retirada pela falta de uma única convivência. Lois não consegue mais sair de seu próprio mundo da solidão porque ela coloca sobre si toda a culpa em sua perda. A culpa, a autonegação, a perda é difícil de ser aceita. Acordar todo o dia e perceber que outra pessoa, que você se importa, não vive enquanto você vive, te faz querer não viver. E Lois não vive mais. Seu mundo traz uma cabeleireira a própria casa, faz com que os vizinhos peguem a correspondência e que ela não consiga mais travar qualquer tipo de afeto com o marido. As lembranças da perda são ainda mais cruéis do que a perda em si. A perda é um sentimento espontâneo e passageiro. As memórias duram o máximo que puderem para aumentar o sofrimento. Doug não consegue aceitar esse estado da mulher, que acaba o deprimindo. A felicidade de Doug é sugada, ele não arranja mais prazer em casa então procura amantes na rua. E Lois, que sabe de sua frigidez e de seus problemas, não faz nada para impedir que Doug pule a cerca. E é nesse mundo que os Rileys vivem e são apresentados ao público nos primeiros minutos da sessão. Doug é adúltera e quer mudar o luto de 8 anos da família; Lois quer viver acreditando que a culpa não é sua. Ambos são incapazes de realizar suas tarefas ou de serem felizes.
O conceito de perda de Doug e Lois choca-se com outro quando Doug parte para Nova Orleans. Depois de perder sua amante, sua única válvula de escape, ele precisa de companhia para não enlouquecer no ambiente mórbido de sua casa. A fuga de seu mundo representa a liberdade, e um indivíduo livre nunca irá querer voltar para a caverna de onde estava preso. Doug conhece Mallory, a menina perdida, que se desviou de seus caminhos após sofrer outras perdas. Mas Mallory é mais realista, por menos sensata que seja. Seu mundo só poderia ser completo com o caminho que ela trilhou, sendo esse a prostituição. E a junção dessas almas perdidas, paulatinamente, leva à afeição. Uma afeição que Mallory tinha perdido após seu trabalho cruel. Uma afeição que Doug tinha esquecido após perder a filha e ver a mulher se tornar distante. E essa afeição leva a mais do que um simples movimento escapista, é a chance de um renascimento. Ele decide conviver com suas memórias, ao se lembrar da filha toda vez que olha para Mallory. Ele decide ser o pai que Mallory não teve e Mallory torna-se a filha que Doug queria ter visto crescer.
Lois acaba sentindo a perda novamente em sua alma. Ela não poderia perder o marido e a filha ao mesmo tempo. Suas relações, por piores que sejam, ainda eram relações. Outra perda seria fatal para a mulher. A história de superação fica por conta das imagens subsequentes. Um casal melhora quando decide confrontar o que lhe perturba, o que não o deixa viver como um verdadeiro casal. E a vida fica bem mais bela quando as lembranças de sofrimento viram lembranças saudosistas e alegres, de uma hora pra outra. James Gandolfini e Melissa Leo colocam um peso imenso em suas atuações, ambos expressando o sofrimento de forma diferente. Enquanto James mostra-se acostumado com sua dor, por mais que não consiga esquecê-la, Melissa sofre diariamente. Kristen Stewart está ótima, para completar o elenco. Sua personagem aqui, com mais expressões e com ações mais rápidas do que em alguns de seus trabalhos anteriores, se torna até divertida numa estória de sofrimento. A fotografia escura e a direção também ajudam a atmosfera do filme a continuar tensa em seus 110 minutos.
Corações Perdidos é, realmente, um filme sobre perda. Mas que acaba se tornando uma auto-ajuda para os perdidos. O filme não fornece respostas, não fornece soluções e não fornece uma conclusão, mas é exatamente assim que a vida é, então porque fazer diferente? A escuridão da zona de conforto, a beleza da dor, a realidade assustadora, tudo prepara o filme para se tornar o que foi: um conto sem qualquer exagero das causas e consequências da vida. O segredo não é segurar algo e não deixar soltar, é saber a hora de deixar ir embora e, assim, viver harmoniosamente sem precisar achar um antagonista.
NOTA: 8

8 comentários:

Adecio Moreira Jr. disse...

Nossa, que belo final de texto...

Eu tô pra ver esse filme logo semana que vem. Eu sou fã de Tony Soprano... ops.. James Gandolfini. O cara é sensacional.

Só espero ficar tão tocado pelo filme quanto você.

Cristiano Contreiras disse...

Eu concordo, integralmente, com seu texto! O filme aborda bem a dor da perda, da dificuldade de superar a morte de alguém querido, da dificuldade em se "encontrar" quando o que parece conforto é o estado de "perdido", da maneira como perdemos nosso eixo no momento que a vida não consegue mais ter a antiga harmonia...fala de muitas coisas. Eu realmente refleti muito com ele. E, sem dúvida, o elenco é ótimo! James e Melissa são atores excepcionais, mas é Kristen Stewart que nos surpreende com um atuação diferente de tudo que já vimos dela.

Abraço!

Alan Raspante disse...

Achei o filme surpreendente também e fiquei bastante emocionado com a trama. No final, é realmente tudo isso o que você falou: pessoas a procura de apoio para consegue a tal felicidade.

Stewart está ótima, sua melhor personagem.

[]s

renatocinema disse...

Fiquei super, mas super ansioso para ver esse filme após seu texto.

Adoro produções que mostrem a dor, o sofrimento.

Penso que a arte tem como obrigação abordar esse tema.

Adoro os protagonistas.

Vou assistir o filme correndo.

Luiz Santiago (Plano Crítico) disse...

Eu PRECISO ver esse filme urgentemente, e dá mais vontade lendo uma texto assim...

ANTONIO NAHUD disse...

Vou procurá-lo, sou fã da Melissa Leo.

O Falcão Maltês

Wallacy disse...

Estou com esse filme aqui em casa há uns meses, acho que esse texto meu deu um ânimo pra vê-lo, hehe

augusto disse...

seu texto eh sempre bom...ate porque é interessante que vc escolhe bons filmes aqui pra debater mas vc poderia ser menos detalhista...voce conta muito do filme e o texto nao parece uma critica mas sim uma sinopse...nao poderia ser mais objetivo nao?? voce poderia ouvir as pessoas que te le aqui, nao?? tente ser mais objetivo...os dois primeiros paragrafos de seu texto ficou confuso pra quem nao viu o filme...

abraço e pense nisso.